sábado, 9 de junho de 2012

EUREKA! Naturismo e Ciência


Sem dúvida a sociedade contemporânea seria muito diferente se o conhecimento cientifico estivesse ausente da sua construção. A ciência hoje é uma saber imprescindível, “normatizando” em muitos casos nossas vidas, como por exemplo restrição do comportamento de fumar em ambientes fechados.
A Ciência introduz-se em praticamente todos os âmbitos de nossas vidas: familiar, social, sexual, trabalho etc. Busca esquadrinhar a nossa existência, no sentido de desvelar o que ainda não foi descoberto ou compreendido. Justifica esta “intromissão” com o argumento de que o conhecimento dos fenômenos, sejam eles naturais ou sociais, permite-nos enfrenta-los melhor, e em alguns casos, elimina-los.
Para o bem ou para o mal, não podemos ignorar o poder que a ciência acumulou ao longo dos séculos. Se no seu nascimento restringia-se a alguns iniciados ou sociedades secretas, hoje qualquer “mortal” poder ter acesso ao saber cientifico, que a partir da Idade Moderna intensificou a “popularização” das suas descobertas ou conclusões. São vários, atualmente, os meios de divulgação aos quais a Ciência recorre, mas, com certeza, a internet é o principal deles, a ponto de algumas revistas cientificas deixarem de publicarem edições impressas adotando a publicação virtual.
A pesquisa cientifica, fundamento da Ciência, permite-nos desbravar “mundos” ainda poucos conhecidos ou de difícil acesso. Seus resultados nos ajudam a lidar melhor com o mundo que nos cerca, compreendendo-o, transformando-o, afetando-nos também, pois o nosso modo de ser e relacionar-se com a vida, mesmo que muitas vezes não nos demos conta disso, passa pelo filtro da ciência. Se durante séculos nossos modos de existência foram fundados nos valores apregoados pelo Estado e pela Religião, contemporaneamente, tal poder é divido com a Mídia e a Ciência.
Na medida em que entendemos mais a vida e o mundo que nos cerca, nosso quadro de referência se amplia. Se estivermos abertos ao novo, ao diferente daquilo que somos ou pensamos, acontece uma revisão de valores fazendo com que algo que antes nos era estranho ou impensável, naturalize-se em nosso referencial em virtude do salto da ignorância para o saber. Daí o conhecimento cientifico ser importante, não o único, na desconstrução de valores que nos levam ao preconceito, discriminação e a intolerância.
Não é por acaso que os movimentos sociais mais mobilizadores contemporaneamente, além de ações políticas e midiáticas, adentraram no mundo acadêmico, na busca de um campo de debate que lhes possibilitasse a construção de um pensamento consistente, de sustentação ideológica e de reconhecimento público. Isso aconteceu com o movimento feminista, o movimento negro, o movimento homossexual, o movimento ambientalista. Uma rápida pesquisa ao site da CAPES (http://capesdw.capes.gov.br/capesdw/) nos permite uma visão aproximada do grau de interesse da sociedade por tais questões.
Na busca com os termos “movimento feminista”, movimento negro”, “movimento homossexual”, “movimento ambientalista” obtivemos as seguintes ocorrências em relação a produção de teses e dissertações no pais desde 1987:

Palavra chave
Ocorrências
Movimento ambientalista
1210
Movimento negro
761
Movimento feminista
459
Movimento homossexual
91
                                       Fonte: CAPES – junho/2012

Quando, repetindo o mesmo procedimento, utilizando o temo “movimento naturista”, obtivemos 18 ocorrências, porém nenhuma destas teses/dissertações apresenta como objeto de pesquisa o nudismo, mas se referem às correntes de pensamento nos campos da Arte, Politica etc.
Utilizando variações dos termos, tais como feminismo, homossexualismo e nudismo, temos os seguintes resultados:

Palavra chave
Ocorrências
Feminismo
1370
Homossexualismo
647
Nudismo
0
                                              Fonte: CAPES – junho/2012

Mas, pesquisando mais detalhadamente encontramos quatro trabalhos acadêmicos que apresentam o movimento naturista como objeto de pesquisa, sendo uma tese (doutorado) e três dissertações (mestrado). O primeiro trabalho foi defendido em 1992 e o último em 2009, nas áreas de Antropologia, Ciências Sociais, Antropologia Social e Educação Ambiental, são elas:

Titulo: O nu e o vestido: uma etnografia fa nudez na praia do Pinho (1992)
Título: “Vivendo “nu” paraíso”: comunidade, corpo e amizade na Colina do Sol (2005)
Titulo: “Da Praia aos Poros”: uma etnografia do naturismo na Praia do Abricó/RJ
(2008)
Título: A ética e a estética dos corpos nus: um estudo de caso do naturismo como proposta de educação ambiental (2009)

Comparando tais resultados com temas voltados para questões sociais, a diferença torna-se bem maior:

Palavra chave
Ocorrências
Saúde pública
7835
Violência
6171
                                            Fonte: CAPES – junho/2012

Até a poesia, arte de “menor consumo” entre os brasileiros, apresenta 3.486 ocorrências no banco de teses da CAPES, indicando que um fenômeno não precisar ser popular para chamar a atenção da academia. Por outro lado, os termos swing/troca de casais apresentam o retorno de duas ocorrências. Coincidência, ou não, tanto o nudismo como o swing são práticas que confrontam as regras morais socialmente vigentes.
Tomemos como exemplo a Universidade Federal da Paraiba, com cursos de graduação e pós-graduação em Turismo, Sociologia, História, Psicologia, Antropologia. Produz anualmente dezenas de monografias, dissertações e teses, mesmo tendo seu principal campus localizado em João Pessoa, a apenas 30 km de Tambaba, não desenvolve sequer uma pesquisa a respeito do naturismo, o que seria “natural” tendo em vista Tambaba ser considerada uma praia de nudismo conhecida internacionalmente, recebendo centenas de turistas estrangeiros. Honrosa exceção encontramos em José Wagner, que luta para inserir a questão do naturismo no cotidiano da Universidade, parecendo, no entanto, obter pouco sucesso.
Olhando o outro lado da moeda, os naturistas também não se mostram muito interessados em discussões cientificas ou teóricas sobre o naturismo. Poucos buscam se apropriarem dos estudos e pesquisas relativas ao tema. Luiz Fernando Rojo e Luciana Arraial foram os únicos autores, que tenho conhecimento, que chegaram a discutir seus trabalhos no meio naturista, e pelo que sei, em apenas uma oportunidade cada. Da mesma maneira, dificilmente encontramos disponibilizados tais trabalhos em sites naturistas, nem mesmo na página da FBrN, que deveria ser a maior interessada, exceto com a monografia de João Carlos Lima (Meio Ambiente e Naturismo),  sequer encontramos uma referência sobre textos acadêmicos.
Cris Natal, propôs a criação de um grupo de estudos sobre naturismo/nudismo via net, mas não conseguiu viabilizá-lo em virtude da inexistência de naturistas interessados na proposta, salvo uma ou duas exceções. Lá se vão alguns anos desta única tentativa de inserir a discussão acadêmica no meio naturista, não ocorrendo, que eu saiba, mas nenhuma mobilização neste sentido.  
Penso que ao distanciar-se da Academia, o Movimento Naturista relega ao limbo um importante espaço de reconhecimento social da prática naturista. As trajetórias dos movimentos sociais - feminista, ambientalista, negro, entre outros - reforçam nosso entendimento. Não há porque mantermos tal distância, pelo contrário, o saber cientifico poderá contribuir, e muito, para que a sociedade aceite que só queremos ficar nus.

Angatu!